segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

NÃO TEM DONO NO BRASIL

Como se pode conhecer um povo? Essa é uma pergunta bem desgastada, é verdade... Mas, uma vez dentro dessa ingrata e enfadonha tarefa, a resposta mais ponderada seria: "Por vários meios, brother!"

Um dos parâmetros mais reveladores é, sem dúvida, o seu produto cultural, em todas suas diferentes manifestações. Entretanto, uma delas, em especial, é pouco analisada e, ao mesmo tempo, por demais reveladora: os famosos ditados populares.

Esses podem servir muito bem como um reflexo fiel do pensamento vivo de qualquer nação. Na Hungria, por exemplo, há um conhecido ditado que diz "Fora da Hungria não há vida. Se há vida, não é vida.", o que demonstra o quanto os magiares estão ligados emocionalmente a sua pátria. Na Suécia temos um famoso anexim que, traduzido livremente, seria algo como "Quem corre com o ovo na mão, pode voltar para raspar a gema do chão", o que revela terem esses nórdicos passado por tempos difíceis e como isso marcou definitivamente seu caráter frente às intempéries. Um dito popular coreano diz: "No Universo, o que é de um pertence a todos. O que é de todos pertence também ao menor dos insetos." Vê-se aí claramente o respeito e o compromisso desse povo oriental com uma visão milenar e holística em relação à natureza. Um conhecido rifão lusitano afirma: "Manuel e Joaquim: os três se estapeiam bem pra mim"... o que realmente não dá pra entender picas...

No Brasil, não é diferente. Os ditos populares refletem como o "consciente coletivo" do nosso país pensa. José Bonifácio afirmou em um de seus livros que os ditados são "... uma pintura dos traços mais verdadeiros do caráter nacional..." Uuuuuuuuuuhhhhh!

E que exemplos de conduta ou de personalidade como Nação nós, brasileiros, oferecemos para o mundo com nossos ditados? O que podemos ensinar a outros povos por meio de nossa "enorme" sabedoria tupiniquim?

Peguemos a esmo um exemplo. Vejamos... o famoso ditado: "Cu de bêbado não tem dono!" Um mote bem conhecido e que nunca caiu em desuso aqui em terras brasileiras. Significa, basicamente, que se você ingerir álcool suficiente para perder o controle de suas funções corporais primárias, pode ser enrabado por uma ou mais pessoas. Que legal, hein? É isso, amigos: encheu a cara de pinga aqui no Brasil, o vizinho chega e pode fazer do seu cuzão um parque de diversões. Aqui, cada um cuide do seu, pois, a rabiola de um sujeito com mais de 18 miligramas de álcool na corrente sangüínea é de domínio público. Não tem dono... É seu, é meu, é de todo mundo.

Apesar de estar localizado num rincão não muito iluminado e de difícil acesso no seu próprio corpo, pode, seu cu, de uma hora pra outra, ser invadido e espoliado por um brasileirão qualquer. E você não precisa nem desmaiar totalmente para levar uma trolha no bozó, não! É só não estar em condições de repelir fisicamente as insistentes investidas de uma caceta mal intencionada por causa do lamentável estado alcoólico em que você se encontra. Infelizmente, muitos bêbados não conseguiram vencer a desesperada luta contra ágeis e sóbrios sodomitas e foram lancetados até a próstata assim mesmo em estado de semiconsciência! "51... Boa idéia é o caralho... Tomei foi no cu... Ê, país escroto!"

Nos grupos de ajuda a dependentes do álcool, em qualquer lugar do mundo, é sempre lembrado que se esses tiverem alguma recaída e se intoxicarem além da manutenção do controle de suas funções corporais, apesar de vulneráveis, acabarão sendo levados por alguém para o hospital mais próximo. Serão medicados e pronto. Agora, no Brasil, estão muito por conta própria e poderão cagar para dentro por causa de quaisquer uns que se interessem pelo seu buraco. Aqui, é assim, moçada. Tem-se a posse, mas perde-se a propriedade fácil, fácil...

Vejamos uma hipótese bem plausível: uma família saindo de um shopping na época das compras natalinas. Caminham alegres e apressados carregando seus pacotes. Quando chegam perto de seu automóvel, Junior, obviamente o caçula, encontra um adulto caído e imóvel entre um carro e outro. Imediatamente avisa a todos sobre o seu achado. O grupo cerca o senhor desfalecido.

O pai examina preocupado o senhor de terno e gravata ali prostrado, temendo pelo pior. Mas após um rápido exame e ao sentir o forte aroma etílico exalado pela da respiração do homem, papai dá um largo sorriso e exclama aliviado: "Ora, vejam só... é um bêbado!" Ah, que maravilha! Os Silva tiraram a sorte grande! Nada como levar para casa um curuzu de um cachaceiro logo na época do Natal! Isso é que é fartura, hein, Silvas?

Ao chegar em casa, o pai carrega esforçadamente o pesado alcoólatra até o elevador. Já em seu lar, ele algema o bebão num cavalete pelos pulsos e tornozelos, deixando-o em arqueado em decúbito dorsal no meio da sala. Logo ele arreia as calças do sem-noção, esfrega as mãos, animado, e coloca uma pequena lanterna em sua própria boca para que possa examinar pormenorizadamente o seu achado, tal qual um dedicado proctologista. "Que beleza, minha gente!", pensa ele, salivando... "Um puta cuzão desses, novinho em folha, dando sopa no meio da rua! Me dei bem! Me dei bem! Viva o Brasil!"

Todos querem se divertir com o embriagado impotente que tomou aquelas doses a mais de whisky. Junior quer dar uma bicuda na bunda do pudim de cachaça. Mamãe quer usar seu recém adquirido creme depilatório nas nádegas do infeliz. A filha adolescente quer ficar com seu cartão de crédito! Ela pergunta: "Papai, posso ficar com a carteira dele?" O pai repreende-a na mesma hora: "Que coisa mais feia, minha filha! A carteira desse coitado tem dono, nome e foto. Pertence a esse senhor que nós achamos na rua, como você bem sabe, querida... agora esse fusquete aqui... é da galera ou não é?" E todos respondem em coro: "Éééééééééééé´!!!!"

Esse é papai, um brasileiro típico... O que será que ele pretende fazer com esse tobaço aí dando sopa? Oras, ele vai obedecer o que manda a tradição brasileira! Vai cravar sua piroca dura no bêbado inconsciente até a goela, enquanto assiste ao Especial do Roberto Carlos na Globo (essa também outra forma de estupro humilhante já bastante tradicional em nosso País). Vai empalá-lo vivo com sua casseta sem piedade alguma até que os globos oculares do cachaça quase pulem fora como duas rolhas de champanhe!

Mas o que outra coisa ele poderia fazer? Ele cresceu ouvindo esse dizer que cu de bêbado não tinha dono! É o que diz o ditado, é o que manda a lei social brasileira. Nós somos brasileiros de verdade ou não somos? No Brasil, cu de bêbado não tem dono! Não tem dono não! Viva o gigante adormecido! E pica na bunda do patrício desacordado aqui...

Não precisa ser gênio para sacar que um ditado escabroso como esse não foi inventado por uma freirinha inocente metida a comediante do convento ou que foi tirado de um malicioso título de alguma pornochanchada dos anos 70. Não é uma piada que se propagou! Se esse ditado existe e é bastante conhecido é porque ELE ACONTECE A TODA HORA! (Caralho, que medo...)

Esse negócio de enfiar na bunda de bêbado é mais uma das brilhantes idéias do povo brasileiro por mais que os nacionalistas obtusos e renitentes não queiram. Ou você também acha que isso não nunca rolou por aqui? Se existe uma frase popular falando sobre esse "curioso fenômeno" é porque muitos cidadãos da terra brasilis já se aproveitaram de algum bebum vacilão! Ok, ok, alardeiam a toda hora por aí que o brasileiro é extremamente solidário, inocente e gente fina, blá, blá, blá... Será que isso é totalmente verdade? Ou será que é um pouco também o "cada um por si", tipo, se você não puder defender o que é seu, alguém virá tirar proveito da forma mais cruel possível. Refletiria bem uma parte da nossa formação como povo? Teria a ver com a aquela psicose de "levar vantagem em tudo, certo?" Ou com o fato de que nada aqui tem limite, que tudo é flexível socialmente ou, em última análise, com o famoso e, diga-se, asqueroso, jeitinho brasileiro.

Um dos poucos países a terem um "ditado" escrito em sua bandeira - "ordem e progresso" - que soa até engraçado de tão díspar que é em relação a sua realidade como Nação - o Brasil consagrou em sua cultura popular uma expressão única no mundo pela sua crueza e que pode ajudar a desmistificar a tão propagada boa índole do brasileiro. Povo esse que não tem o hábito de se auto-criticar, está há pouco tempo na escola e prefere mais se preocupar com assuntos importantíssimos como o melhor futebol do mundo, carnaval e com bunda. Bunda? Tem dono? Ah, não é tão assim? Pergunte para o bêbado que acorda no beco e volta pra casa andando que nem um caubói pra cagar sangue... ah, provavelmente foi um algum argentino malvado...

É isso mesmo, amigos. É como diz o ditado aqui: cu de bêbado não tem dono. E viva a terra da caipirinha!


Adolar Gangorra tem 91 anos, é editor do periódico humorístico Os Reis da Gambiarra e não toma Caracu de jeito nenhum!

2 comentários:

Anônimo disse...

veja os comentários a este texto no site http://www.mdig.com.br/index.php?itemid=4999

Sunflower disse...

depois que todo mundo se serve o cara ainda tonto leva um tapinha na bunda e é mandado pra casa, todo tordo.

"Keep Walking"

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